O mapa da descrença

O mapa da descrença

Cardeal Paul Poupard


Em uma entrevista concedida ao site zenit.org, o cardeal Poupard, que foi o homem de João Paulo II para a Cultura, traça “o mapa da descrença religiosa no mundo”, sublinhando as características mais importantes de cada região ou país. Mesmo que os dados mudem rapidamente, eis aqui o “mapa” a partir de um ponto de vista oficial − o da hierarquia da Igreja Católica.

“A descrença deixou de ser um fenômeno reduzido a alguns poucos indivíduos para converter-se em um fenômeno de massa”, constata o encarregado de João Paulo II para a Cultura.

O cardeal Paul Poupard declara que esta situação se dá ‘sobretudo nos países nos quais domina um modelo cultural secularizado’.

O purpurado francês, nesta entrevista concedida ao site Zenit, traça o mapa da descrença religiosa no mundo, tema ao qual se dedicou a Assembleia Plenária do Conselho Pontifício para a Cultura, do qual ele é presidente, celebrada no Vaticano.

– Mas não falam muitos sociólogos do “retorno ao sagrado”?

Muitos falam de um “retorno ao sagrado” sem detalhar que se trata mais do surgimento de uma nova religiosidade fraca, sem uma referência a um Deus pessoal, algo mais emotivo que doutrina. Assistimos à despersonalização de Deus. Esta nova religiosidade não coincide com um regresso à fé e constitui um autêntico desafio para o cristianismo.

– Que relação tem esta religiosidade com o ateísmo?

O ateísmo militante está retrocedendo no mundo, mas se dá um fenômeno de descrença prática que cresce em ambientes culturais impregnados de secularismo.

Trata-se de uma forma cultural que eu qualifico de “neopaganismo”, na qual a religião constitui uma idolatria dos bens materiais, um sentimento religioso mais bem panteísta, que se encontra muito a gosto com teorias cosmológicas, como as da Nova Era.

Evidentemente é necessário refletir sobre este fenômeno, que é típico das culturas secularizadas do Ocidente.

– Quais são os resultados do estudo realizado com motivo da Assembleia do Conselho Pontifício para a Cultura?

As situações mudam segundo os países e os continentes. Na África, a descrença afeta a população de origem europeia e seu influxo se faz sentir nas grandes cidades. Em um país como a África do Sul há mais de seis mil igrejas diferentes. É difícil, portanto, falar de descrença.

Na América do Norte, nos Estados Unidos, os ateus declarados são 1%, enquanto que os “sem Igreja” são 15%. A maior parte dos cidadãos americanos reza, enquanto só 1% declarou que não reza nunca.

Na América Latina, Cuba é o único país no qual ainda está no poder em regime controlado por grupos maçônicos de orientação anticlerical. Pois bem, 90% dos mexicanos são católicos e 100% devotos da Virgem de Guadalupe. Isto dá uma ideia das raízes profundas da religiosidade popular.

Na América Central, a piedade popular resiste às sirenas do modelo secularizado. No Brasil, onde se encontra o maior número de católicos do mundo, assistimos à passagem de fiéis da Igreja Católica para outros grupos cristãos. Nos anos cinquenta os católicos eram 93,5%, hoje são 73,8%. No mesmo período, as igrejas cristãs passaram de 0,5% para 15%.

Na Argentina, 4% da população declara-se ateia e 12% agnóstica.

Na Ásia a situação é muito diferente: como comentou um bispo asiático, “não se dá o fenômeno da descrença, pois não há nenhuma crença”.

No Japão, por exemplo, existe um verdadeiro supermercado das religiões: se somarmos o número dos xintoístas, taoístas, budistas e cristãos, temos uma porcentagem de 125% da população, pois muitos afirmam seguir várias religiões.

Nas Filipinas, único país da Ásia de grande maioria cristã, com 82,9% de católicos e 4,57% de muçulmanos, só 0,3% deixa vazio o espaço dedicado à religião.

A Coreia do Sul é um país interessante, com o maior número de conversões ao catolicismo.

– Mas, então, onde se dá o fenômeno da descrença?

Notícias preocupantes chegam da Europa, com importantes diferenças entre a área mediterrânea, o centro e o norte.

Na Itália, 4% se declaram ateus, 14% indiferentes, a maioria crente, mas que só participa de vez em quando na vida da Igreja.

Na Espanha, acontece um processo de pulverização cultural e religiosa apoiado pelos governos de cultura socialista.

Na Europa Central nos encontramos com os três países que declaram o número mais elevado de pessoas sem religião: Bélgica, com 37%; França, com 43%; e os Países Baixos, com 54%.

A França continua sendo o país com o maior número de ateus: 14%. Neste caso, sinto a tentação de fazer uma comparação com o final do Império Romano.

No Reino Unido, 77% da população declara-se cristã. Os anglicanos são a maioria, mas o número de católicos que vai à Igreja supera o dos anglicanos em números absolutos. Na Grã-Bretanha, 14% afirmam que não têm religião.

Nos países escandinavos, Islândia, Dinamarca, Sué-cia, Noruega, os católicos são uma minoria que cresce à chegada de novos imigrantes de Filipinas e Coreia.

Na Dinamarca, as pessoas sem religião são 11%; 11,6% na Noruega; e 12,7% na Finlândia. Nestes países, por uma parte se dá a secularização; por outra se constata o culto da natureza de influências pagãs, segundo as quais a natureza é sagrada.

Na Alemanha há que distinguir entre o leste e o ocidente. 60% na ex-república do leste declaram não ter religião, enquanto no ocidente esta porcentagem é de 15% e se dá, sobretudo, nas grandes cidades.

Na Polônia os não crentes são muito poucos, mas se pode dizer que o materialismo marxista está substituindo o materialismo consumista, e esta é a maior preocupação.

Na Hungria, dos dez milhões de habitantes, tão só 887 pessoas se declaram ateias, mas a maior parte da população vive a religião a seu modo.

Na República Tcheca, a metade da população se considera ateia ou sem confissão religiosa, enquanto a Eslováquia é em sua maioria católica.

– Que se pode dizer estatisticamente falando dos países islâmicos?

Nos países de maioria islâmica não há dados de confiança, pois se não se é crente não se pode dizer. Mas por esse motivo os números são falsos.

– Que conclusões o senhor tira depois de traçar este mapa?

O ateísmo militante retrocede, mas diminui a pertença ativa à Igreja. A descrença não cresce no mundo, com exceção dos países nos quais está presente o modelo cultural secularizado.

Cresce a indiferença religiosa sob a forma de ateísmo prático. Desde o ponto de vista pastoral, o mais preocupante é que a descrença está avançando, inclusive entre as mulheres. Durante milênios a fé foi transmitida na família pelas mães, enquanto agora assistimos a uma fratura.

Também se dá um fato novo: cresce o ser humano indiferente, ou seja, o homem ou a mulher que pode crer sem pertencer e pertencer sem praticar.

Aumenta o número de quem diz ser religioso, mas não vai à Igreja e que crê em toda uma série de práticas que em ocasiões formam parte do terreno mágico.

– Ante esta situação, há sinais de esperança para a Igreja Católica?

Certamente. Sublinho, sobretudo, os novos movimentos religiosos, neocatecumenato, focolares, Comunhão e Libertação, Renovação Carismática...

Desde há um quarto de século, constatamos a expansão numérica e geográfica que experimentaram. Encontro-me com eles em todo o mundo e cresceram também em intensidade e profundidade espiritual.

Trata-se de uma reação suscitada pelo Espírito Santo para responder à cultura secularizada. No momento no qual parece que se dá uma dissolução, apre “A descrença deixou de ser um fenômeno reduzido a alguns poucos indivíduos para converter-se em um fenômeno de massa”, constata o encarregado de João Paulo II para a Cultura.

O cardeal Paul Poupard declara que esta situação se dá ‘sobretudo nos países nos quais domina um modelo cultural secularizado’.

O purpurado francês, nesta entrevista concedida ao site Zenit, traça o mapa da descrença religiosa no mundo, tema ao qual se dedicou a Assembleia Plenária do Conselho Pontifício para a Cultura, do qual ele é presidente, celebrada no Vaticano.

– Mas não falam muitos sociólogos do “retorno ao sagrado”?

Muitos falam de um “retorno ao sagrado” sem detalhar que se trata mais do surgimento de uma nova religiosidade fraca, sem uma referência a um Deus pessoal, algo mais emotivo que doutrina. Assistimos à despersonalização de Deus. Esta nova religiosidade não coincide com um regresso à fé e constitui um autêntico desafio para o cristianismo.

– Que relação tem esta religiosidade com o ateísmo?

O ateísmo militante está retrocedendo no mundo, mas se dá um fenômeno de descrença prática que cresce em ambientes culturais impregnados de secularismo.

Trata-se de uma forma cultural que eu qualifico de “neopaganismo”, na qual a religião constitui uma idolatria dos bens materiais, um sentimento religioso mais bem panteísta, que se encontra muito a gosto com teorias cosmológicas, como as da Nova Era.

Evidentemente é necessário refletir sobre este fenômeno, que é típico das culturas secularizadas do Ocidente.

– Quais são os resultados do estudo realizado com motivo da Assembleia do Conselho Pontifício para a Cultura?

As situações mudam segundo os países e os continentes. Na África, a descrença afeta a população de origem europeia e seu influxo se faz sentir nas grandes cidades. Em um país como a África do Sul há mais de seis mil igrejas diferentes. É difícil, portanto, falar de descrença.

Na América do Norte, nos Estados Unidos, os ateus declarados são 1%, enquanto que os “sem Igreja” são 15%. A maior parte dos cidadãos americanos reza, enquanto só 1% declarou que não reza nunca.

Na América Latina, Cuba é o único país no qual ainda está no poder em regime controlado por grupos maçônicos de orientação anticlerical. Pois bem, 90% dos mexicanos são católicos e 100% devotos da Virgem de Guadalupe. Isto dá uma ideia das raízes profundas da religiosidade popular.

Na América Central, a piedade popular resiste às sirenas do modelo secularizado. No Brasil, onde se encontra o maior número de católicos do mundo, assistimos à passagem de fiéis da Igreja Católica para outros grupos cristãos. Nos anos cinquenta os católicos eram 93,5%, hoje são 73,8%. No mesmo período, as igrejas cristãs passaram de 0,5% para 15%.

Na Argentina, 4% da população declara-se ateia e 12% agnóstica.

Na Ásia a situação é muito diferente: como comentou um bispo asiático, “não se dá o fenômeno da descrença, pois não há nenhuma crença”.

No Japão, por exemplo, existe um verdadeiro supermercado das religiões: se somarmos o número dos xintoístas, taoístas, budistas e cristãos, temos uma porcentagem de 125% da população, pois muitos afirmam seguir várias religiões.

Nas Filipinas, único país da Ásia de grande maioria cristã, com 82,9% de católicos e 4,57% de muçulmanos, só 0,3% deixa vazio o espaço dedicado à religião.

A Coreia do Sul é um país interessante, com o maior número de conversões ao catolicismo.

– Mas, então, onde se dá o fenômeno da descrença?

Notícias preocupantes chegam da Europa, com importantes diferenças entre a área mediterrânea, o centro e o norte.

Na Itália, 4% se declaram ateus, 14% indiferentes, a maioria crente, mas que só participa de vez em quando na vida da Igreja.

Na Espanha, acontece um processo de pulverização cultural e religiosa apoiado pelos governos de cultura socialista.

Na Europa Central nos encontramos com os três países que declaram o número mais elevado de pessoas sem religião: Bélgica, com 37%; França, com 43%; e os Países Baixos, com 54%.

A França continua sendo o país com o maior número de ateus: 14%. Neste caso, sinto a tentação de fazer uma comparação com o final do Império Romano.

No Reino Unido, 77% da população declara-se cristã. Os anglicanos são a maioria, mas o número de católicos que vai à Igreja supera o dos anglicanos em números absolutos. Na Grã-Bretanha, 14% afirmam que não têm religião.

Nos países escandinavos, Islândia, Dinamarca, Sué-cia, Noruega, os católicos são uma minoria que cresce à chegada de novos imigrantes de Filipinas e Coreia.

Na Dinamarca, as pessoas sem religião são 11%; 11,6% na Noruega; e 12,7% na Finlândia. Nestes países, por uma parte se dá a secularização; por outra se constata o culto da natureza de influências pagãs, segundo as quais a natureza é sagrada.

Na Alemanha há que distinguir entre o leste e o ocidente. 60% na ex-república do leste declaram não ter religião, enquanto no ocidente esta porcentagem é de 15% e se dá, sobretudo, nas grandes cidades.

Na Polônia os não crentes são muito poucos, mas se pode dizer que o materialismo marxista está substituindo o materialismo consumista, e esta é a maior preocupação.

Na Hungria, dos dez milhões de habitantes, tão só 887 pessoas se declaram ateias, mas a maior parte da população vive a religião a seu modo.

Na República Tcheca, a metade da população se considera ateia ou sem confissão religiosa, enquanto a Eslováquia é em sua maioria católica.

– Que se pode dizer estatisticamente falando dos países islâmicos?

Nos países de maioria islâmica não há dados de confiança, pois se não se é crente não se pode dizer. Mas por esse motivo os números são falsos.

– Que conclusões o senhor tira depois de traçar este mapa?

O ateísmo militante retrocede, mas diminui a pertença ativa à Igreja. A descrença não cresce no mundo, com exceção dos países nos quais está presente o modelo cultural secularizado.

Cresce a indiferença religiosa sob a forma de ateísmo prático. Desde o ponto de vista pastoral, o mais preocupante é que a descrença está avançando, inclusive entre as mulheres. Durante milênios a fé foi transmitida na família pelas mães, enquanto agora assistimos a uma fratura.

Também se dá um fato novo: cresce o ser humano indiferente, ou seja, o homem ou a mulher que pode crer sem pertencer e pertencer sem praticar.

Aumenta o número de quem diz ser religioso, mas não vai à Igreja e que crê em toda uma série de práticas que em ocasiões formam parte do terreno mágico.

– Ante esta situação, há sinais de esperança para a Igreja Católica?

Certamente. Sublinho, sobretudo, os novos movimentos religiosos, neocatecumenato, focolares, Comunhão e Libertação, Renovação Carismática...

Desde há um quarto de século, constatamos a expansão numérica e geográfica que experimentaram. Encontro-me com eles em todo o mundo e cresceram também em intensidade e profundidade espiritual.

Trata-se de uma reação suscitada pelo Espírito Santo para responder à cultura secularizada. No momento no qual parece que se dá uma dissolução, apresentam um intenso sentido de agregação e de pertença, testemunham uma forte religiosidade, arraigada no encontro eclesial e pessoal com Cristo: nos sacramentos e na oração, na liturgia, na celebração da Eucaristia. sentam um intenso sentido de agregação e de pertença, testemunham uma forte religiosidade, arraigada no encontro eclesial e pessoal com Cristo: nos sacramentos e na oração, na liturgia, na celebração da Eucaristia.

www.zenit.org/article-4697?|=portuguese

 

Cardeal Paul Poupard

Ex-presidente do Conselho Pontifício para a Cultura